segunda-feira, 21 de março de 2016

“EU VOU VOTAR NA MULHER DO LULA”

   Por Emanuel Medeiros Vieira 

Não se trata de discutir o que é ser uma pessoa de bem, mas de sê-la (Marco Aurélio – imperador romano e filósofo)

   Não, não mudei de lado. Foram “eles” que mudaram. Se eles mudaram, rasgando qualquer princípio ético, não podem obrigar-nos a seguir o mesmo caminho. 
   Pouco antes das eleições de 2014 (primeiro turno). Eu em Campo Formoso, cidade que fica aproximadamente a 410 KM de Salvador.   Já na faculdade, coordenador de uma coluna de cinema na extinta “Folha da Tarde” e escrevendo para o tradicional “Correio do Povo”, de Porto Alegre, amava aquelas feiras enormes do Nordeste nos dias de sábado. Havia ido a Salvador, pela primeira vez, representando a AP (Ação Popular), aos 21 anos, em 1966. (Voltando - tantos anos depois em algumas cidades, como Milagres e Vitória da Conquista- “enxergava” Glauber Rocha filmando o sertão e seus mitos). 
   Mas não vim falar sobre isso.
   No sábado, perto das eleições (primeiro turno), fui à feira com a Célia, um cunhado e alguns amigos. “Todo mundo estava lá”, as pessoas que viviam longe das cidades, vendiam seus produtos. Cegos cantadores, muita comida, roupas etc.
(A mudança: Em vez dos jegues que via antes, agora eram as motos que dominavam a paisagem). E a sensação de que eu estava ainda num mundo não dessacralizado, ainda mítico. 
    Estava me preparando para experimentar umas comidinhas típicas da região, deliciar-me com uma rapadura, experimentar frutas típicas e andar pela enorme feira.
   Eis que sinto um movimento, barulho, um carro de som, alto falante, gente de vermelho. 
   Um locutor gritava: - “Quem não votar na Dilma, perderá a Bolsa-Família”. 
   Não aguentei. Interpelei um dos membros da “comitiva”.

   - É isso o que vocês fazem cm esse povo simples, que dizem querer libertar? 
   Silêncio. 
    -Vocês estão praticando o “‘marxismo fisiológico”? 
   Um dos membros da turma me disse, com um sorriso de deboche:- Com esse povo, a gente faz isso mesmo. 
    Alguém que estava comigo falou que era melhor eu parar. Havia jagunços, matadores. E alguns pareciam proteger os “defensores do povo”.

   Por segurança, parei. E a cantilena continuou.

 ”Quem não votar na Dilma, perderá a Bolsa-Família


   A cantilena se repetia.
   O Brasil que quase ninguém vê, o Brasil das funduras.

   E lá, sendo praticado uma espécie de sub-leninismo tropical, ou um “maquiavelismo do sertão”.

   Era essa gente que iria “libertar” o povo brasileiro.

   Estava cansado de tanta traição. 
   Este era o amor e a compaixão que um partido dito libertador tratava um povo tão humilde.
   Conversei com pessoas anônimas, sertanejos, gente simples - que Glauber tanto amava.

   - Se a gente não votar ‘neles’, vamos perder a Bolsa. 

   Outro disse: “Eu vou votar na mulher do Lula”.

   Com este sertanejo conversei mais. Para ele, DILMA ERA MULHER DO LULA MESMO - esposa, consorte.

   Olhei a feira, senti o calor, tanta gente, e fui andando entre as barracas e pensando nos meus sonhos de juventude. E lembrei-me de tantos que lutaram ou morreram, honradamente, defendendo seus princípios, sem enganar, como o meu amigo Luiz Travassos, Honestino Guimarães, Stuart Angel e tantos outros. 
   Percebi que não havia qualquer respeito ou compaixão, que essa gente – perdoem a ingenuidade – não amava o povo, não queria transformação alguma. Tais pessoas queriam apenas se dar bem.

   Era a tomada do poder a qualquer custo, pegar “bocas”, aparelhar todo o Estado, com uma incrível compulsão pela mentira.

   Quando vejo hoje tais pessoas no poder, deslumbradas, implantando uma república de cleptocratas, tendo a mentira como arma, subestimando a nossa inteligência, usando um linguajar (pelas transcrições de conversas autorizadas pela Justiça) de lupanar (pedindo perdão aos donos de bordel), fazendo as mais tenebrosas transações, só posso dizer: - Que tristeza! 
   Um socialismo  com empreiteiras: será este o grande sonho?

   Não, não mudei de lado. Foram “eles” que mudaram. Se eles mudaram, rasgando qualquer princípio ético, não podem obrigar-nos a seguir o mesmo caminho.

   Ainda ressoa nos meus ouvidos o locutor e o seu alto falante: “Quem não votar na Dilma, perderá a Bolsa-Família”.

   Mas – relevem a pompa – a gente não perdeu os princípios.

Alguns me chamaram de “moralista”. Pode ser. Mas não quebraram a nossa espinha dorsal – se não quebraram na OBAN, nos meses passados no DOPS, não mais quebrarão.

   O couro está mais duro (para as pancadas).

   Só peço: sejam mais dialéticos, leiam mais e deixem o fundamentalismo redutor, o maniqueísmo mesquinho. 

E lembrem-se. Ladrão é ladrão Não tem ladrão de “direita” ou de “esquerda”. É só ladrão!

(Brasília, 18 de março  de 2016)
Comentário:
   Ouvi essa história contada na época pelo próprio Emanuel, meu Tio Tadeu. Eu e meu pai Paulo ouvimos novamente esta história na tarde do dia 16 pp, dia da divulgação do conteúdo venal, mesquinho, nefasto, nada republicano, amoral, sexista e podre das conversas telefônicas do 'companheiro ' Lula, que já mereceu meus votos. 
   O texto é o retrato e as gravações a trilha sonora desse festim político diabólico, promovido por essa Nomenklatura tupiniquim movida a pixulecos, rapadura corporativa, mentiras abundantes, sórdido cinismo e muito Romané Contè correndo no rio seco do agreste como um leninismo cachaceiro. São minúsculos, Emanuel. Invisíveis, comparados aos que tiveram pendurado o próprio couro no varal da ditadura em nome de um ideal, mas sem perder a decência, a vergonha. 
Abraço do teu sobrinho e amigo, Paulinho.
 

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