terça-feira, 27 de maio de 2014

Denúncias, Falatório

Amaury Ribeiro Jr.: Como funcionou a Privataria do futebol brasileiro



   O Lado Sujo do Futebol, da Editora Planeta, entre outras histórias conta a da privatização do futebol brasileiro. Primeiro por João Havelange, em seguida por Ricardo Teixeira, que Amaury Ribeiro Jr., autor deA Privataria Tucana, define como “o quarto irmão Marinho”. Isso porque, obviamente, a privataria do futebol serviu a gente poderosa: Roberto Marinho e os filhos, por exemplo.
   A investigação foi um trabalho coletivo, assinado por Amaury Ribeiro Jr., Leandro Cipoloni, Luiz Carlos Azenha e Tony Chastinet.

Abaixo, um aperitivo, conforme antecipado pelo blog do Juca:

Amigos íntimos
“Esse carro teve um desastre nos Estados Unidos. E faleceu uma pessoa que era muito querida minha.” – Ricardo Teixeira
   
   O caminho que nos leva até a fonte do mistério corta os pântanos da Flórida, nos Estados Unidos. Nossa viagem vai de norte a sul, de Orlando a Miami. Paramos para abastecer. O bando de corvos que cerca a lanchonete anexa ao posto de gasolina dá um ar surreal à nossa missão, que faz lembrar os contos cavernosos de Edgar Allan Poe. Mas o nosso objetivo é justamente separar ficção de realidade. Estamos atrás da verdade escondida no acidente que pode ter mudado a história do futebol mundial.

   Na saída 193, fazemos o retorno na Florida Turnpike e ajustamos o contador de quilometragem. Após 26 quilômetros, paramos no acostamento, no ponto exato indicado por um boletim de ocorrência em nossas mãos. Um carro da polícia rodoviária para em seguida. Educado, o policial nos adverte que só se pode estacionar ali em casos de emergência. Explicamos o motivo de nossa presença. “Façam o que for preciso e saiam depressa.”

   Um de nós já está dentro da mata. Seus gritos fazem mais barulho que o motor da viatura policial que arrancava dali. No meio da lama, peças antigas de um automóvel – um friso de plástico, um pedaço de para‐choque. Coincidência ou não, aqueles pedaços de carro nos enfiam num túnel do tempo. Voltamos a outubro de 1995, uma sexta‐feira 13.

   Passava pouco da meia‐noite quando um luxuoso BMW preto cortava em alta velocidade a Turnpike. Com o pé firme no acelerador, uma bela jovem carioca, morena, esguia, cabelos lisos escuros, sobrancelhas arqueadas. Adriane usava colares, pulseiras e anéis dourados. Estava acompanhada por Lorice, a quem havia buscado no Hotel Marriot, em Boca Raton.

   Era uma noite típica dos outonos no Estado do Raio de Sol, lema oficial da Flórida: 25 graus, céu limpo. Numa fração de segundos, o carro se desgovernou a mais de 160 km/h. Rodopiou, capotou e caiu em um lago. A jovem morena ficou presa nas ferragens. A amiga, ferida, foi retirada do veículo por motoristas que pararam no local. Adriane de Almeida Cabete, de 23 anos, morreu afogada na madrugada daquela sexta‐feira. O acidente encerrou o conto de fadas que ela começara a viver meses antes no Brasil.

   A maior parte desse conto de fadas havia se passado na Flórida, terra dos parques de diversão da Disney, em Orlando. Uma das principais atrações por lá é o Castelo da Cinderela, cópia do original de Neuschwanstein, na Alemanha, cenário da história da moça pobre que uma fada‐madrinha transforma em princesa. Para a estudante Adriane, nascida e criada perto do morro do Alemão, subúrbio do Rio de Janeiro, o condomínio de luxo Clube do Polo, em Delray Beach – de onde ela teria saído pilotando sua carruagem conversível –, era a materialização de um castelo. Na fábula, o encanto de Cinderela se quebra à meia‐noite.

   O acidente que transformou em abóbora o mundo de Adriane ocorreu aos seis minutos da madrugada. Na história infantil, o sapato de cristal perdido por Cinderela ao descer correndo a escadaria do palácio do baile real leva até a moça o príncipe do final feliz. Na história de Adriane, o conversível puxa o fio da meada deste livro‐reportagem: o veículo estava em nome de Ricardo Teixeira – à época, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), dono do futebol brasileiro então tetracampeão mundial e casado com Lúcia Havelange, filha do na época todo‐poderoso presidente da Fifa, João Havelange.

   Um eventual relacionamento de Ricardo Teixeira com Adriane, 35 anos mais nova que ele, seria uma questão privada se não houvesse no caso detalhes intrigantes. Lorice Sad Abuzaid, a amiga de Adriane, era na data do acidente empregada de Wagner José Abrahão, empresário de turismo, parceiro de negócios de Ricardo Teixeira e beneficiário de contratos suspeitos com a CBF. Desde 1995, as contas bancárias de Lorice, Wagner e Ricardo Teixeira só aumentaram. E, pelas revelações a serem feitas neste livro, vão crescer ainda mais com a Copa do Mundo do Brasil em 2014.

   Adriane é apontada como pivô da separação do cartola e Lúcia Havelange e do estremecimento com o sogro que o havia lançado e protegido no futebol. O objetivo desta reportagem é separar boatos da realidade e responder perguntas que o episódio levanta. São questões de interesse público e não de vida privada. A investigação, como se verá, traz à luz uma rede de conexões, irregularidades e indícios que, embora tenham ocorrido na paisagem ensolarada de Miami, são de fato bastante sombrios.

  “Isso é um assunto pessoal. Vocês não têm autorização para falar sobre isso. Minha mãe e doutor Ricardo Teixeira estão afinados para processar vocês”, ameaçou por telefone, aos gritos, a advogada Yolanda, filha de Lorice, ao ser questionada por nós.

   No final de 2013, documentos disponíveis na Junta Comercial do Rio de Janeiro, em repartições e cartórios públicos provavam que Yolanda está equivocada. O acidente não é assunto meramente pessoal. Ao contrário: desvenda o envolvimento do ex‐presidente da CBF com Wagner José Abrahão, um dos principais beneficiários dos negócios envolvendo CBF e Fifa em torno da Copa do Mundo no Brasil.

   Os documentos mostram que, na época do acidente, Lorice, a sobrevivente, já era funcionária de Abrahão. Foi ela também quem arranjou trabalhos esporádicos para Adriane na agência de viagens contratada pela CBF. Esses primeiros contatos foram fundamentais para que a jovem frequentasse o mundo de Teixeira em Miami.

   Com exceção da família de Adriane, que vive ainda no mesmo apartamento humilde na zona norte do Rio, as demais pessoas ligadas ao acidente enriqueceram, e muito, nas últimas duas décadas. Lorice era uma simples funcionária de uma das empresas de Abrahão, dono da agência contratada para organizar as viagens da seleção brasileira e dos dirigentes da CBF (inclusive na Copa de 1994, que acontecera no ano anterior, nos Estados Unidos). Na ocasião, aos 40 anos, morava com o marido, um advogado trabalhista. Os dois dividiam um apartamento de classe média no centro de Niterói.

Leia reportagem completa. Beba na fonte.

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