quinta-feira, 3 de setembro de 2009

O DURO OFÍCIO


Por Olsen Jr.

Estava em Rio Negrinho, Norte do Estado, tratando de assuntos de família inadiáveis, às voltas com pagamentos de taxas, de um vai e vem burocrático sem muita razão, mas tudo recheado com muitos carimbos. Parece que nada funciona se não houver alguns carimbos estampados no papel. É assunto para outro dia, mas começou assim.

Aí toca o celular e a repórter, após se apresentar, indaga à queima roupa: “por que o senhor quer entrar na Academia Catarinense de Letras?”...

Ao tempo que escrevo essas mal traçadas a eleição ainda não se deu, mas quando forem publicadas na sexta-feira, já se saberá o resultado, o que no momento ignoro, portanto o que digo aqui não interferirá no desfecho, trata-se apenas de um desabafo e de uma profissão de fé, se preferirem, da qual, naturalmente, não abro mão.

Passado o susto, remonto aos idos de 1970 (do século passado) para buscar na história, no tempo passado e presente, a dureza que tem sido essa caminhada, no quanto tem de inexplicável, de absurdo, de loucura, de incompreensão, de desespero, de desprezo, de desdém, de acídia, da força que temos de buscar no inaudito para suportar o caminho, uma estrada que não tem atalhos, um destino que não se encontra em mapa algum, a poeira e a aridez dos lugares inóspitos com os quais nos deparamos e a maldição que todo o escritor carrega porque a penitência é avançar sozinho, mas o caminho, como afirma o poeta, se faz ao caminhar, então tocamos em frente. Não se olha para trás porque a impressão que temos é de que não estamos avançando, o que foi percorrido é um trecho sempre menor daquele que está a nossa disposição, além da inerente consciência fatídica de que não teremos tempo. O que nos move? Quando souber disso a busca terá terminado e a vida não terá mais sentido, portanto, a caminhada continua.

Digo para a repórter que tudo começou quando fui surpreendido fazendo um poema em uma prova de cálculo diferencial e integral II enquanto cursava engenharia civil em Blumenau e certamente aquela energia ou impulso criativo era maior que a racionalidade que deveria se impor para solucionar equações matemáticas. Deixar-se levar pela arte parece cômodo, o difícil foi suportar o desdém da professora fazendo tal constatação. Ser observado num ato criativo é constrangedor, parece que temos uma obrigação de compartilhar com o vulgo de nossas dores, o que não corresponde com a verdade que a grande arte carrega. Mas aquele ato parecia concentrar todas as forças do universo e nunca mais fui o mesmo... Dobrei aquele papel contendo algumas questões de menor importância e onde havia gravado sentimentos profanos, guardei no bolso e sem dizer nada, me levantei e sai da sala. Ouço até hoje os gritos daquele silêncio que se seguiu. Aquele vácuo de dezenas de olhares e dedos me apontando na rua como se dissessem “ali vai o desvairado que abandonou uma profissão lucrativa para ser poeta”...

Depois de malhar por mais de 35 anos esse ferro frio que é a literatura, escrito duas dezenas de livros, quero dizer que sobrevivi bem aos acenos de todas as facilidades porque, querem saber? Nunca tive nenhuma. Meu caráter foi forjado tomando decisões quando o medo calava todo o mundo. Sempre fui uma voz destoando no coreto dos homens acomodados. Desafino para chamar a atenção do desdém e da indiferença porque o sonho vale muito e é o que nos transforma.

Quase esqueço, a Academia é uma estação de passagem, um momento de trégua para um artífice que pratica uma arte menos por ser “diferente”, mas porque sem ela, sua vida não teria a menor importância.

Agradeço aos meus pais por esse discernimento, alô seu Oldemar e dona Nica, aonde vocês estiverem, muito obrigado!

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