domingo, 11 de maio de 2014

O CRIME DE MARONI

   Por Janer Cristaldo
   Não que eu pretenda defender quem explora a prostituição. Mas não é fácil entender a sanha com que autoridades se empenham em condenar Oscar Maroni, um entre os milhares de exploradores do ofício em São Paulo.

   Desta vez, foi o Sepex-SP (Sindicato das Empresas de Publicidade Exterior do Estado de São Paulo) que notificou as três empresas veiculadoras dos outdoors que a Bahamas Hotel Club pagou para serem exibidos em rodovias de São Paulo, como Imigrantes, Castelo Branco e Bandeirantes. As peças começaram a ser veiculadas nas últimas semanas pela boate localizada em Moema, na zona sul da capital paulista, famosa por ser freqüentada por garotas de programa e que foi fechada em 2007 por irregularidades e reaberta em setembro último acrescentando a palavra "Hotel" ao nome.

   O diretor executivo do Sepex, José Roberto Fogaça, afirma que as peças começaram a ser retiradas na última terça-feira e que esta é uma questão vergonhosa, pois a entidade não defende nem faz apologia, de forma alguma, à prostituição. “Não se pode dizer que a peça é ilícita, mas atenta à moral e à ética. Não é assim que gostaríamos que os consumidores vissem os nossos painéis. O sindicato, representando as empresas de mídia exterior, tem feito várias campanhas contra o crack, doação de sangue, ações de benefício público. É desse jeito que queremos ser lembrados”, destaca Fogaça.

   As empresas de publicidade usam a mulher para vender desde cerveja a automóveis, e de repene o sindicato da classe se enche de brios ante anúncios que vendem... mulher. A peça traz o título “Bahamas Hotel Club – Onde suas fantasias se tornam realidade” e mostra uma mulher bronzeada, de short provocativo e salto alto, agachada em frente a um homem de chuteiras e com o calção abaixado. O painel também exibe a foto de Oscar Maroni, que responde a processo por suspeita de incentivar a prostituição, identificando-o como “proprietário”.

   Como se mulher não fosse mercadoria neste nosso mundinho capitalista. A julgar pela manifestação do sindicato, até parece que prostitutas não existem neste país.

   Em outubro de 2011, a juíza Cristina Ribeiro Leite condenou a 11 anos e oito meses de reclusão Oscar Maroni, o autodenominado "empresário do erotismo". Empresário sem dúvida é. Sua boate, próxima ao aeroporto de Congonhas, que funcionou até 2007, era freqüentada por garotas de programas e clientes de alto poder aquisitivo.

   O Bahamas oferecia o que dezenas de boates continuam oferecendo em São Paulo: shows de striptease, sauna mista, restaurante executivo com cardápio variado e também contava com 23 suítes luxuosas para encontros íntimos. Por ocasião dos eventos da Fórmula 1 na cidade, a boate desempenhou importante função social. Recepcionava em média cerca de 400 clientes, entre eles o pessoal de algumas escuderias famosas da Fórmula 1 com shows eróticos com garotas de programas que usavam o tema baseado no evento automobilístico. Agora que se aproxima a Copa, querem roubar de atletas, turistas e autoridades o bem-bom da vida.

   Maroni já esteve preso, por ordem de Gilberto Kassab, por ter construído um hotel de 11 andares na esquina da rua dos Chanés com a alameda Anapurus, a 600 metros de uma das cabeceiras da pista do Aeroporto de Congonhas, ao lado da boate Bahamas. Após o acidente com o vôo TAM 3054, o prefeito cassou o alvará de aprovação e construção do hotel. Ocorre que o acidente da TAM nada teve a ver com altura de edifícios. O avião estatelou-se em um posto de gasolina. A situação se arrasta até hoje na justiça.

   A juíza Cristina Ribeiro Leite usou de vasta erudição para proferir sua sentença, apelando a experts do ramo. Entre elas, a prostituta-celebridade Bruna Surfistinha, que em seu livro O Doce Veneno do Escorpião assim descreve o Bahamas, onde ela, entretanto, nunca trabalhou: "De bom gosto, elegante mesmo. Por fora, você nem se toca do que é lá dentro. As garotas que vi por lá não tinham nada de anormal, não tinham puta estampado na testa nem ficavam na porta se oferecendo a quem passasse".

"Se o Bahamas não é uma casa de prostituição, o que seria uma casa de prostituição?", alega a juíza várias vezes ao longo da sentença. Claro que é casa de prostituição, e isto Maroni não nega. Mas não aceita a pecha de proxeneta. "Sou apenas um empresário que está sendo perseguido por trabalhar no ramo da diversão masculina. O Bahamas nunca ficou com um só centavo do que as moças auferiam como prostitutas". Segundo ele, o local era aberto a homens e mulheres em busca de lazer adulto. "Se alguém queria fazer programas, tratava privadamente com seus clientes. A casa não tinha participação alguma nisso".

   Ora, São Paulo tem milhares de boates do gênero, algumas de alto luxo, outras médias e muitas vagabundas mesmo, que continuam fornecendo sexo a quem quiser pagar por sexo. Similar à Bahamas, até bem pouco havia o Café Photo, de suntuosos interiores. Fechado há alguns anos, voltou a instalar-se no chique bairro de Vila Nova Conceição. Foi interditado em 2010, não por prostituição, mas por falta de alvará para funcionar. Com a interdição, as meninas simplesmente migraram para uma outra boate, o Garden. E tudo continua como dantes no quartel de Abrantes. O proprietário aguarda pela liberação da prefeitura para a boate voltar a funcionar.

   Se a Dra. Cristina pretendia mandar para a cadeia quem tem casa de prostituição em São Paulo, precisaria construir mais cárceres. A pergunta que se impõe é uma só: por que o Maroni? A acusação é de exploração da prostituição, o que constitui crime em nosso Código Penal. Mas isto é de difícil comprovação. Em primeiro lugar, ninguém viu as moças repassando dinheiro ao proprietário das Bahamas. Em segundo, nenhuma profissional vai denunciar quem lhe propicia ambiente de trabalho, conforto e proteção. Em terceiro, Maroni pode dispensar tranqüilamente qualquer colaboração das meninas.

   Maroni cobrava R$ 69 por hora passada em uma das 23 suítes de intensa rotatividade à disposição da clientela. Pelas contas da juíza, uma diária custaria 24 vezes R$ 69, ou R$ 1.656, "dignos do Ritz de Paris, para um quarto onde abundam espelhos e faltam armários!!! Seguramente, sem as lindas garotas de programa não haveria clientela perdulária para justificar o preço".

   A juíza parece ter descoberto a América. Claro que sem as lindas garotas não haveria clientela perdulária. Quanto a ser perdulário, isto não é crime nem pecado. É perdulário não quem quer, mas quem pode. Aparentemente, a doutora preferiria uma espelunca suja e baratinha, ao alcance dos não-perdulários.

   Com esse faturamento, não há porque achacar as meninas. Isso sem falar na consumação mínima, bebidas e comida. Por outro lado, faltou assessoria à Meritíssima. Se consultasse a Surfistinha, talvez entendesse porque não há armários em uma boate. Bordel é local de trabalho, não de moradia.

  Prostituição, particularmente a de luxo, exige gerenciamento. Alguém tem fornecer o local, as instalações e tratar inclusive da segurança das moças. Não se imagina uma profissional de luxo catando clientes nas calçadas. Diga-se de passagem, essas pobres meninas que se prostituem nas ruas melhor viveriam se alguém as administrasse. Entregues à própria sorte, têm de repassar boa parte dos parcos ganhos a seus cafetões.

   Pelo jeito, o crime do "empresário do erotismo" é o de ser bem sucedido no ramo. Entre os milhares de motéis que anunciam seus serviços nas rodovias, só o de Maroni está provocando indignação.

Um comentário:

  1. Talvez seja só eu que ache contraditório empresas de publicidade, que utilizam dos mais variados meios para induzir os consumidores à compra por impulso, reclamarem de uma outra propaganda, que praticamente atua da mesma forma.

    A moralidade é relativa, depende muito do lado do muro onde esta.

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